Não é possível a atividade de cabeleireiro em imóvel residencial
Apesar da jurisprudência passar por uma transformação em nome do progresso (com tendência para flexibilizar e encerrar restrições de loteadores antigos), não é permitido amparar os propósitos insensíveis e mercantilistas de um investidor empresarial que, ciente da proibição, ainda assim adquire o imóvel e, contra tudo e todos, instala um salão de cabeleireiros e anexo de comidas gourmet, sem autorização.
Com esse entendimento, a 4ª Câmara de Direito Privado do
Tribunal de Justiça de São Paulo proibiu o dono de um salão de cabelereiros
de utilizar com finalidade comercial um imóvel situado em zona residencial
de Piracicaba, devendo paralisar as atividades sob pena de multa diária de R$
10 mil, até o limite de R$ 2 milhões.
De
acordo com os autos, o empresário adquiriu um imóvel dentro de um loteamento
com restrições (uso exclusivamente residencial) e o transformou em um salão de
cabeleireiro com área de serviço gourmet. A associação de moradores do local
buscou a Justiça para manter o caráter residencial do bairro.
O
desembargador Enio Zuliani, relator do acórdão, afirmou que, no caso em
questão, o direito da coletividade, representada pela associação de
moradores, deve prevalecer. Segundo o magistrado, nessas disputas é
preciso ponderar sobre a razoabilidade e a proporcionalidade dos direitos.
"A
associação que recorre possui direito abstrato de controle da legalidade das
construções, porquanto representa o grupo de proprietários e essa coletividade
não deseja que se instalem lojas, salões de cabeleireiro e outros tipos de
comércio", completou.
Zuliani
disse que o empresário simplesmente adaptou e reformou o imóvel para
funcionar um comércio onde só existe residências: "Esse propósito
mercantil que está sustentando no lucro e para seu intento protocolizou requerimento
(licença) para fins residenciais, escondendo sua real deliberação (alterar o
sentido para salão de cabeleireiro com anexos de venda de pães, doces, comidas
em geral)".
O
relator também falou em "obstinada aventura empresarial, que pode até ter
justificativa na lei de mercado ou da dura sobrevivência concorrencial",
mas que encontra bloqueio no princípio da igualdade (artigo 5º, caput, da
Constituição Federal). Para ele, não existe razão para excepcionar a situação
do empresário porque isso representaria ofensa da isonomia. A decisão se deu
por maioria de votos, em julgamento estendido.
A
relatora sorteada, desembargadora Marcia Dalla Déa Barone, ficou vencida. Ela
julgava improcedente o pedido da associação para proibir o funcionamento do
salão de beleza do réu. Segundo a desembargadora, uma lei municipal mais
recente permite a exploração de “serviços e comércio de apoio à moradia”,
o que demonstra não haver exclusividade quanto ao uso estritamente residencial
do loteamento.
"E,
na hipótese dos autos, o serviço exercido pelo réu de cabelereiro enquadra-se,
sem dúvida, como serviço de apoio à moradia", disse. Ela afirmou ainda que
as normas municipais menos restritivas não prejudicam a garantia de qualidade
de vida aos moradores do loteamento em questão, tampouco prejudicam as áreas
verdes preservadas e o sossego dos moradores.
Processo 1014020-57.2018.8.26.0451
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